ARTIGO

 

Paradoxal

José Antônio Veiga Sanhudo
Porto Alegre - RS
josesanhudo@yahoo.com.br

Nos últimos 120 anos com a descoberta dos Raios-X e mais intensamente ainda nos últimos 45 anos com o advento da tomografia computadorizada e da ressonância magnética, a medicina diagnóstica mudou de patamar para um nível muito superior. Certamente nunca fomos tão precisos no diagnóstico como nos dias de hoje, mas paradoxalmente o médico nunca foi tão desrespeitado e processado como agora. Ou seja, estes avanços não melhoraram a relação médico-paciente. A verdade é que por mais que se queira negar, a sofisticação dos exames de imagem abreviou a necessidade de se ouvir uma história detalhada e simplificou o exame físico, afinal a imagem já nos dá o diagnóstico! Aquele tempo escutando e palpando o paciente, que é o que fortifica uma relação mais humana, diminuiu consideravelmente nas últimas décadas. Além disso, a especialização nos tornou mais eficientes no diagnóstico e na terapêutica e, por isso também, a nossa consulta pode ser mais rápida, já que conseguimos desvendar o problema mais facilmente do que um generalista. O inconveniente é que esta consulta fugaz enfraquece por demais a relação interpessoal, deixando-nos menos empáticos.

Embora seja possível opinar sobre diagnósticos e tratamentos baseados em imagens enviadas por correio eletrônico ou por mensagem de celular, sabemos que nada é mais preciso do que uma história detalhada e um adequado exame clínico para fechar o diagnóstico e, sobretudo para direcionar uma conduta terapêutica. Quantas vezes já nos deparamos com exames de imagem dissociados do exame clínico! Imagens de artrose evidente em pacientes sem sintomas, ou exames normais em pacientes altamente sintomáticos fazem parte do nosso dia-a-dia, reforçando que o mais importante é o paciente e seus sintomas, sendo o exame de imagem subsidiário.

Por fim, há o aviltamento dos honorários médicos praticados pelas operadoras de saúde, obrigando o profissional a atender mais pacientes no mesmo período de tempo para continuar mantendo seu patamar de remuneração.  Lidamos com problemas simples, mas também complexos, indicamos procedimentos triviais e outras vezes desafiadores. Precisamos entender que participamos de dilemas que podem mudar a vida do paciente para melhor ou para pior. Pacientes com problemas incapacitantes, muitas vezes em cadeiras de rodas, nos procuram para voltar a ficar de pé ou conseguir caminhar. Nem notamos, mas frequentemente dividimos a vida dos nossos pacientes em duas fases: antes e depois da cirurgia. Esta parte maravilhosa da nossa atividade profissional, seguidamente, não é valorizada no furacão do dia-a-dia. Os exames de imagem somente devem ser avaliados depois de se ouvir a história completa e de se realizar um exame clínico detalhado. Além de aguçar a capacidade diagnóstica do médico, esta conduta básica vai reforçar sobremaneira a relação médico-paciente. Se o caso for muito simples e o diagnóstico evidente, procure se interessar pela vida do paciente. É incrível como muitas vezes nos surpreendemos com histórias pessoais fantásticas, sobretudo de pacientes de mais idade. Cada indivíduo que você encontra, sabe algo que você desconhece. Aprenda com ele! A medicina nos proporciona o contato diário com pessoas das mais diferentes características, que têm em comum somente a confiança depositada nas nossas palavras.